Obesidade e depressão são dois grandes problemas de saúde pública desafiadores no mundo todo. Todo médico, independentemente da especialidade, depara-se no dia a dia com esses diagnósticos em pacientes de todas as idades. Entretanto, o maior problema de ambas as doenças é o estigma que o paciente sofre. A obesidade e a depressão podem ser isoladas. Cada condição pode ser estigmatizada e ter sérios efeitos para a saúde, além do seu impacto imediato. Tanto a depressão quanto a obesidade têm ligações genéticas fortes, de modo que filhos de pessoas com um ou ambos os problemas estão mais predispostos a tê-los também.

Curiosamente, quando ocorre um destes problemas de saúde, o outro geralmente também se desenvolve. Poderiam os efeitos de um sério excesso de peso levar diretamente à depressão? Ou a depressão, por si só, causa o excesso de peso?

Causa ou efeito? Depressão na obesidade

No estudo RADIANT, Hung et al. encontraram uma associação entre obesidade e depressão. No entanto, ao realizarem duas análises de variáveis ​​instrumentais, os autores identificaram que o excesso de peso provavelmente não é uma causa importante de depressão maior e concluíram que o IMC elevado provavelmente não causa depressão. A associação pode ​​ser explicada por causalidade reversa e/ou confusão residual ou, algum outro fator, ainda desconhecido, que possa esclarecer a associação entre essas condições. Portanto, o estudo RADIANT torna difícil apoiar uma conclusão abrangente de que a obesidade causa depressão.

Claramente, esse estudo não é a última palavra. As duas condições têm sido associadas e há muita especulação sobre uma relação causa e efeito. Para um indivíduo, é fácil entender como a obesidade pode ser um gatilho para a depressão e como a depressão pode causar comportamentos alimentares que levam à obesidade. Diversas pesquisas procuram soluções e/ou ligações entre as doenças, inclusive se há ligações físicas e psicológicas entre elas.

Pesquisadores continuam a explorar os complicados vínculos físicos e psicológicos entre eles. Não é surpreendente que os dois sejam associados: 10% da população dos EUA exibe pelo menos alguns sintomas de depressão e 2/3 têm excesso de peso ou obesidade. Todavia, os dois estão funcionalmente relacionados?

O efeito do eixo HPA impacta na depressão e na obesidade

Os hormônios do eixo hipotálamo-pineal-adrenal (HPA) é um conjunto complexo de influências de direção e interações de feedback envolvendo o hipotálamo, a glândula pituitária e as glândulas suprarrenais – partes do sistema nervoso que secretam uma variedade de hormônios. As três partes deste eixo HPA funcionam juntas para manter os produtos químicos do corpo equilibrados quando uma pessoa está sobre estresse.

O eixo HPA é responsável pela liberação de cortisol, que é disparado para neutralizar os efeitos do estresse. O cortisol tem uma série de efeitos, com destaque para a acumulação de gordura em torno do abdome. O estresse sustentado também pode levar à depressão.

Para fins de tratamento e prevenção, é importante adquirir mais informações sobre a interação longitudinal entre obesidade e depressão. Uma revisão sistemática confirmou uma ligação recíproca entre depressão e obesidade. A obesidade aumentou o risco de depressão, mais pronunciada em norte-americanos do que em europeus, e a depressão clinicamente diagnosticada. Além disso, a depressão mostrou-se preditiva do desenvolvimento da obesidade.

No estudo representativo de crianças e adolescentes norte-americanos na faixa etária entre 2 e 19 anos, a prevalência de obesidade em 2011 a 2014 foi de 17% e a obesidade extrema alcançou 5,8%.  Mais de 1/3 dos adultos e 17% dos jovens nos EUA são obesos. A prevalência da obesidade permanece elevada e, portanto, é importante continuar a vigilância.

Snook et al. ressaltaram que o peso corporal socialmente aceitável está aumentando, sendo menos motivada a perda de peso insalubre. O excesso de peso, a obesidade ou a obesidade grave aumentam significativamente o risco de desenvolver muitas outras doenças, como diabetes tipo II, hipertensão, doença cardíaca, acidente vascular encefálico (AVE), osteoartrite, entre outras.

Para apresentar uma visão geral da associação entre sintomas depressivos na infância e adolescência e posterior sobrepeso na vida adulta, foi realizada uma revisão de 1º de janeiro de 1997 a 30 de maio de 2007. Os resultados revelaram associação entre sintomas depressivos e sobrepeso em meninas de 8 a 15 anos. Os sintomas depressivos na infância ou na adolescência estão associados a risco aumentado de 1,90 a 3,50 vezes de sobrepeso. As conclusões com base nesses resultados suportam uma associação positiva entre sintomas depressivos com idades entre 6 e 19 anos e sobrepeso na vida adulta, a qual é avaliada após um período de 1 a 15 anos.

Para entender completamente as consequências físicas e de saúde mental da obesidade adolescente, a dimensão social e cultural do peso deve ser examinada. Nos EUA, mais de 9 milhões de crianças e adolescentes de 6 a 19 anos são afetados pelo excesso de peso, estando 70% delas mais propensas a permanecerem afetadas na idade adulta. Os fatores ambientais, como a falta de atividade física e os avanços tecnológicos, levaram a um estilo de vida mais sedentário.

As pessoas afetadas pela obesidade são muitas vezes conscientes de sua aparência ou suas habilidades físicas. Elas retiram-se ou são excluídas das atividades sociais e se sentem mais isoladas de amigos, colegas de trabalho e entes queridos. Enquanto isso, seus sentimentos de autoestima continuam diminuindo e, ao mesmo tempo, a obesidade afeta outros sistemas de órgãos, causando falta de ar, dores, problemas de sono, dores no peito e problemas digestivos – tudo isso pode desencadear sentimentos de tristeza e desespero, característicos da depressão.

Do mesmo modo, a depressão é debilitante, e o indivíduo que sofre de depressão pode estar menos motivado a se exercitar, menos capaz de seguir uma dieta de perto ou de preparar alimentos saudáveis, agarrando-se em algo rápido e tornando-se menos convencido sobre a necessidade de cuidar de sua própria saúde.

Houve um aumento rápido no tempo gasto no uso da internet como plataforma para entretenimento, socialização e fonte de informações. Hoare et al. avaliaram a relação entre a duração de tempo na internet para lazer, os sintomas depressivos e a angústia psicológica em adolescentes australianos. Os comportamentos dos adolescentes para melhorar os resultados de sua saúde física (como em caso de excesso de peso ou obesidade) são imperativos para que a sua relação recíproca com a saúde mental seja conhecida e possa ser incluída em desenvolvimentos de saúde pública.

No entanto, o uso da internet pode ajudar na saúde mental e, portanto, ser um fator de risco modificável para alcançar e melhorar os resultados para essa faixa etária, embora seja recomendada precaução na interpretação das descobertas, em virtude de algumas inconsistências emergentes dessa evidência.

Já a depressão maior é um transtorno de alta prevalência, idade de início precoce e alta persistência. Muitos países confirmam a importância mundial da depressão. Embora a evidência não seja definitiva, a depressão desempenha um papel causal em associação a muitos desfechos adversos, como a obesidade.

Recentemente Abbasi publicou estudo, destacando que 1/4 dos candidatos à cirurgia bariátrica apresenta algum distúrbio mental. Os dados do trabalho mostram que a incidência da depressão e da compulsão alimentar em obesos é 2 vezes maior do que na população em geral. Isso comprova a importância do acompanhamento psicológico e psiquiátrico de candidatos à cirurgia bariátrica, bem como de indivíduos que já se submeteram ao tratamento cirúrgico da obesidade. Esse assunto será abordado em breve aqui.

Fonte: Gen Medicina

Autora: Alexandrina Maria Augusto da Silva Meleiro

Doutora em Medicina pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Médica Psiquiatra pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e Coordenadora da Comissão de Atenção à Saúde Mental do Médico da ABP.

Biópsias de Próstata com Sedação / PAAF
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